29 de maio de 2010

NINGUÉM COMPRA O MEU CARINHO


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A apropriação capitalista do movivento gay acontece tão lentamente e de forma tão sedutora que o próprio movimento termina desejando que isso ocorra. Acontece sempre da mesma forma, primeiro surge um movimento, um grupo, uma manifestação diferente de pensar, contra-cultural, inovadora. Depois disso os artistas se vestem com as cores desse movimento novo e chama aquilo de “choque cultural”. Acham que a marginália entrou na galeria para que a elite econômica não possa fazer vista grossa para ela.
Keith Haring - artista plástico (1958-1990)
Enquanto o movimento estava restrito a um número pequeno de pessoas e se manifestava na rua, as vezes causando conflito com a cultura existente. Era legítimo o grupo, seus conceitos e suas propostas. Eles tinham voz e a usavam. Falavam para quem passasse. Pense nos punks, nos nerds e nos emos. São pessoas que se unem porque são amigos ou tem personalidades parecidas e se uniram para trocar experiências.
Stonewall Inn
Aconteceu o mesmo com os gays começou quando os homossexuais começaram a se reunir em bares nos Estados Unidos para paquerar sem medo de serem rotulados como promíscuos ou condenados por religiões e pelos códigos criminais. Até então inexistia qualquer ideologia, era a afinidade quem ditava as regras, como os outros gupos citados.

Depois aconteceu da polícia repreender e os artistas promoverem aquela manifestação despolitizada. Embora diferentes nas atitudes, ambos emolduraram e confinaram. Nos dois casos o apelo era o choque, o susto, o instantãneo. Enquanto os homoafetivos não se reconheciam como grupo, a polícia dava-lhes um motivo para se unirem e os artistas, um motivo pra se exibirem. Afinal eram marginais a partir de agora e se tornaram parte de uma contra-cultura, uma nova proposta de vida e assim foram vendidos: como a contra-corrente da arte. Um movimento libertário, uma nova moda, uma evolução.

Robert Mapplethorpe - fotógrafo (1946-1989)
Tom of Finland - ilustrador (1920-1991)

Fazendo isso, os artistas mostraram para a elite econônmica exatamente o que ela queria: o circo dos horrores, o exótico, o grotesco. Para eles não faz diferença subir numa montanha russa ou entrarda numa galeria de arte. Um pouco medo não faz mal a ninguém, até eleva os níveis de adrenalina e causa prazer. Devem pensar “estamos seguros aqui” porque essas obras não pode nos fazer mal.
Acontece que até hoje a arte tem um limite de provocação que quando é ultrapassado gera protestos. Como foi o caso de Márcia X.


Perceba que quanto mais se reprime uma manifestação natural, mais se politiza a questão e abre-se a brecha para um movimento organizado. Os policiais só assustam enquanto não há unidade de grupo. Assim que o grupo se organiza, perde o medo e daí vem o confronto, o conbate, a contra-corrente. E a partir da repressão se justifica a luta. Como foi na ditadura militar.


Mas lutariam por qual bandeira? Pelo direito de se esconder num bar e não ser incomodado no início, depois pelo direito de poder circular pelas ruas sem ser agredido, depois pelo direito de poder se casar e adotar filhos e até onde pudermos avançar. Avançar até a unidade de cultura onde todos serão novamente saculejados por um grupo que inventa que uma característica em comum justifica a aglomeração.

Alguma coisa nesse plano ficou pelo caminho. Você não percebe porque passa rápido demais, mas existem coisas que precisam ser melhor analizadas. Por exemplo, a família do comercial de margarina. Hoje em dia temos muitos tios e poucos irmãos porque o perfil dos casais mudou completamente desde o primeiro confronto entre policiais e os cliente do bar Stonewall Inn. Não podemos querer ter duas mães ou dois pais e um casal de filhos adotados por que isso seria copiar o modelo adotado e trair o ideal livbertário construído por galerias de arte e repressões policiais.

O movimento começou a partir de um bar, um local de comércio. Quem olhasse de fora veria um bando de homens rindo e cambaleando pelo excesso de álcool. Como o de bêbado não tem dono, faziam orgias, não no bar, porque tinham medo, mas era 1969, época de liberdade sexual e pírula. Por isso eram vistos como promíscuos, por isso eram pejorativamente chamados de gays que em tradução grosseira, significa “alegre”. 
Mas uma alegria provocada pelo êxtase da bebida.
Alegres

Depois de se afirmarem como grupo político e de sair nas ruas pra mostrar que existiam e que gostavam de festas e de bebidas, caíram nas garras das empresas que prometiam segurança e sigilo caso quisessem desfrutar de uma noitada tranquila, mas para isso precisavam pagar um preço.

 Guara Gay do mesmo fabriante do Guaravita

E assim saíram do confinamento da polícia e passaram ao confinamento das boates gays. Alguns artistas assumiam para si a posição de ativistas homossexuais e conseguiam com isso chamar mais atenção para sua vida pessoal que para suas obras. Depois o design se apoderou da estética gay, depois a publicidade se apoderou da estética gay e no fim os gays já não se reconheciam mais fora dos signos que foram feitos para eles e desejaram se ver na televisão. Queriam um modelo para seguir. Queriam ver um beijo entre dois homens, queriam um cartão de crédito gay, uma festa gay, uma vila gay. E sem perceber quiseram o isolamento porque podiam pagar por ele.
 Fred Mercury (1946-1991) e Frida Khalo (1907-1954) estão á venda
Vejo até os governos hoje em dia patrocinando as paradas gays e reforçando o turismo sexual por conta disso. Da janela dos prédios, na segurança de suas salas e quartos, a elite econônica nos acena. Andamos no nível da rua e eles do alto de sua ascenção social nos observam. Seguros de que nada lhes fará mal, assim como nas galerias de arte.Antes havia a moldura do quadro, hoje a moldura da janela. A mesma dstãncia segura de quem nã quer se envover. Éramos marginais e viramos bobos da corte. Um desfile circence agrada pelo colorido e pela alegria. Para uma platéia que assiste o carnaval de camarote, o Cirque du Solei de camarote, a parada gay de camarote e não se mistura, não interage, não dialoga, não desce do salto.


Todas as vezes que eu paguei para entrar em algum bar ou boate gay fui bem recebido, bem servido e bem agarrado, bem beijado, bem esfregado contra a parede. Mas ao entrar num ambiente não direfionado, não fui bem recebido, nem bem servido, até fui beijado mas esse beijo gerou protestos. E como sou da turma dos marginais, não me intimido e continuo me esfregando nas paredes quando tenho vontade. 


Em muitos lugres a polícia continua batendo nos gays. Se não reagirmos, se não ganharmos as ruas, vamos continuar sendo vítimas das empresas que acham que só gostamos de festas e de bebidas. Não pensem que vai existir um feijão gay, um miojo gay, um liquidificador gay.

Consumir produtos gays só reforça as barreiras e nos torna cada vez mais invisíveis. Vamos usar as ruas, os parques, as praças, todos esses locais públicos onde estaremos longe de quem nos estorque em troca de descrição e sigilo. Só se esconde quem faz algo de que se envergonha. Eu não tenho vergonha, mas também não digo que eu tenha orgulho.

 Show da Daniela Mercury (micareta + abadá + bejo gay)

Gostar de homens ou de mulheres, de salto alto e calcinha, de sapato ou de bota, de garba e peito cabeludo, de cabelo comprido e piercing no umbigo. São todos elementos do corpo e da relação entre os corpos. Eu me sinto atraído por certas características e elas são de minha preferência dentro de um expectro sexual. E meu desejo não depende do dinheiro que eu guardo no bolso.
Meu beijo é de graça, eu não vendo.

3 comentários:

  1. Vc tem uma visão dicotômica das coisas que não ajuda em nada. "Ou ocupo lugares públicos ou os específicos para LGTS". Ora, pq esse paradoxo? Eu faço os dois. E muito bem, por exemplo.
    "Ela, a elite econômica"!!! Porque esse pronome na terceira pessoa? Basta ver todas as pesquisas sobre gays e constatar que nós temos muito mais anos de estudo e maior renda do que as pessoas das cidades onde moramos. De novo, vc vê um mundo partido. Tenta construir barreiras gigantescas onde, não tem jeito, tudo já se enovelou.
    Melhor seria você largar esse mundo preto e branco e se inspirar na bandeira arco-íris, na qual há pelo menos seis cores para se ver o mundo.

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  2. Seu post é fantástico! O movimento foi muito bem explicado e a relação das empresas com o público gay, como se estivesse comprando a "marca" do movimento. A frase que eu mais gostei foi essa " Só se esconde quem faz algo de que se envergonha." Eu sinto isso e por isso sou assumido desde o 16, não devo nada a ngm, sei que não estou fazendo nada de errad e por isso não devo esconder minha orientação sexual. Parabéns!

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  3. Obrigado pelos comentários. O que responder neste caso, quando um ama e o outro nem tanto? posso dizer que atingi o objetivo: provocar uma reação.

    Wlton, a dicotomia foi usada propositalmente para demarcar o dentro e fora do movimento.

    Usei elite econômica e não cultural novamente para que ninguém confundisse.

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