22 de agosto de 2010

Viado da periferia


"Sou um punk da periferia, Sou da Freguesia do Ó" assim Gilberto Gil começava sua canção nos idos 1983, nem eu era nascido. E já se falava com um certo carinho da luta das classes mais pobres para afirmarem uma identidade cultural que muitas vezes negava a cultura imposta pelo mercado. Local frequentado apenas pelos que tem poder de compra. Essa música é parte integrante do EP Extra e conta ou pelo menos tenta contar como é a cidade vista por quem está na base da pirãmide social.


Hoje há outros movimentos culturais que ora negam ora se apropriam da cultura do mercado para se afirmarem como autofalantes da massa assalariada que habita a periferia do círculo social. Onde está a visibilidade gay neste contexto, nesse submundo, no universo paralelo que a tv não mostra? Ainda bem que existe um amplificador chamado internet. Um não-lugar onde as flores gritam vozes de mundos distantes.

Peço que não estranhem a precariedade das instalações. A casa é humilde mas é limpa. A gente não tem grana mas a gente sabe o que é consumo e admiramos as vitrines, sustentamos uma indústria de produtos piratas para fingir que somos iguais aqueles que usam grifes. Mas queremos um trejeito e linguagem própia. Queremos dizer bicha-boy no lugar de barbie, queremos ficar de jogação ao invéz de abravanar. E dizemos perigón sem nem saber direito o que é. Abafa entón, porque bicha equê é aquela que não dá o edi sem ver o aqüé, becha assim é uó, mona. Elas adoram dar a elza!

O primeiro vídeo que constitui esse mosaico do imaginário da periferia é de uma travesti. O que há de mais purulento que a sargeta, a prostituição e as constantes batidas policiais? Não ter independência sobre o proprio corpo que é alugado por uma hora e depois de lavado está pronto para outra é a sina dessas pessoas que ficaram no entreposto do binômio homem x mulher. Ela se chama Garota X e canta o funk "Mulher Banana".



Depois do Suburbio carioca, vamos para a o lixão paulista, onde as raíses do Hip Hop penetraram mais fundo. Enquanto que a Zona Sul do Rio é a terra das famílias rica, em São paulo ela é terra de ninguém. O machismo e a violência andam lado a lado. A demosntração de poder está no revolver e no caralho que vazam as bocas dos impuros, dos X9 e das almas sebosas, na fala do Pequeno Principe.

Novamente um homem vestido com a identidade feminina assume os problemas sociais do grupo que o rejeita e diz no rap "Pantera Cor de Rosa" que a arte é o único modo de escapar da vida criminosa. O único lugar onde vc é respeitado é no palco.



Como se fosse uma doença, a pobreza se alastra pelo mundo e a internet a acompanha e rouba sua alma. A alma dos pobres vira objeto de consumo e galhofa dos mais ricos. Qualquer vídeo hoje tem uma propaganda por cima e uma rizada por trás. Tudo é muito engraçado: o banguela, o ébrio, o louco, o drogado. Tudo vira piada, hum humor que se fosse negro, teria orgulho.

Favela são as vielas entre os barracos onde as enchentes e incêncdios que abrem estradas. Até nas Filipinas existem favelas e homossexuais dentro delas. Um deles se chama Lady Gaguita, dubla, filma, expõe a ferida e se apresenta como um subproduto da indústria cultural. Chamem como quiser, eu considero ele um sobrevivente do caos.

 


Esses meninos do grupo Night Boys são muito corajosos de gravar um clipe no espaço público, no meio de uma feira-livre. Mas também são desbravadores por ocuparem justamente a rua e questionarem sua utilização. Se serve para casais hetero trocarem beijos também serve para grupos gays dançarem fantasiados de Pussy Cat Dolls. O elemento masculino e feminino se dissipa nessas horas. Como se fosse um teatro, o rosto é pintado e o personagem externado. 



Nem tudo vem de fora, nem toda indústria se mantém no mercado com a mesma matéria prima. É preciso renovação. O mais brasileiro dos ritmos, o samba, nascido no morro, abraçado pelo asfalto e ouvido até em Marte ("Coisinha do Pai" de Beth carvalho em 1997 foi usada pela nasa para acordar o robô que explorava o solo do planeta vermelho) vem contar o que mudou desde que Gilberto Gil compôs seu Punk da Periferia até os dias de hoje.

Um comentário:

  1. Lembrei desse curta http://www.portacurtas.com.br/Filme.asp?Cod=344 Com Bezerra da Silva, em que fala sobre a linguagem do morro, esta foi criada por estarem cansados de não entenderem o que a elite falava, então criaram sua própria dialética, para que dessa forma aquilo fosse compreendido só entre eles.

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